quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Carta Aberta

Escrevo para te dizer que ainda me surpreendo quando percebo que mais de vinte anos se passaram desde aquele domingo.

Para contar que acho estranho o fato de o teu rosto já não aparecer tão nítido em minhas memórias e, mesmo assim, eu não esquecer do teu olhar. Nem do tom de voz. Nem do sorriso.

Para admitir - e, com isso, tentar mitigar - este aperto no peito causado pela vontade de te dar um abraço apertado, daqueles que só criança sabe dar - até porque, atrapalhado que sou com as palavras, não saberia fazer outra coisa se te reencontrasse.

Mas peço compreensão pela minha franqueza ao esclarecer que, apesar de ocupares um espaço considerável da minha nostalgia, não é dor o que sinto por não estarmos lado-a-lado. O tempo em que dividimos espaço e sonhos ainda é, para mim, motivo de lembranças e alegrias maiores.

Ah, e antes que eu esqueça ...
em dias que, como hoje, acordo com uma saudade sem tamanho, pego o violão e canto baixinho Terra de Gigantes, como se tu me assistisses.

Feliz Aniversário!

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

O sujeito e as palavras

Quando aprendeu a ler e escrever – com a ajuda da mãe e ainda com “letras separadas” – tinha entre quatro e cinco anos. O pai, orgulhoso, apresentava aos amigos o menino que já lia jornais e rabiscava palavras em maiúsculas. Tomou gosto por gibis, revistas e pequenos livros naquela época, o que mais tarde acabou relegando a um terceiro ou quarto plano.

Das leituras da infância e adolescência, assim como dos aprendizados de matemática e informática, assimilou algumas noções de lógica que lhe davam certa segurança mesmo ao discutir assuntos que não dominava. Se não tinha como contrapor idéias, pelo menos acompanhava os raciocínios. Sabia a ordem ao concatenar premissas. Às vezes, por conseguir seguir a obviedade dos assuntos, até cometia alguns comentários interessantes durante as exposições. E outras – muitas – tantas vezes não. Óbvio.

Cultivou, por algum tempo, o gosto duvidoso por trocadilhos – o primeiro sinal de que havia algo errado em seu trato com as palavras. Por um lado, a facilidade em subverter significados ou perceber humor onde alguém falava sério. Por outro, exatamente a irritação das pessoas, que o chamavam de “moleque debochado”. Aprendeu que fazer graça é mais questão de “timing” do que necessariamente de jogo de expressões. Mas ainda não perdeu completamente o hábito.

Com os amores que teve – um de cada vez, é claro – percebeu, invariavelmente, que significados são valores relativos. Que termos simples, como “sim” ou “não” podem representar diferentes coisas. Aliás, que quase nunca serão exatamente “sim” ou “não”.

Compreendeu, com o passar do tempo, que palavras sozinhas não dão conta da comunicação. Que o “vacabulário” – como ironizava – relativamente rico pode ser insuficiente ao entendimento se não se souber entender o contexto – que nem sempre é lógico – e se não se conseguir sentir o significado do silêncio – que, não raro, é quem consegue melhor explicar a situação.

Precisava então admitir, àquela altura da vida, que havia uma estranha defasagem na sua forma de se relacionar com as palavras ... nada alarmante mas, ao mesmo tempo, não tão tranqüilo quanto poderia desejar. A grosso modo, sentia como se não soubesse se fazer ajudar por elas quando mais precisava. Era como se procurasse cuidadosamente e, na última hora, escolhesse a mais errada (im)possível.

Não desconsiderava o fato de que a comunicação constitui um fenômeno tão complexo que haverá sempre, pelo menos: a palavra que se pretende dizer, a palavra que se diz e a palavra que o interlocutor ouve e compreende. E que a tendência é de que as três sejam diferentes (tese corroborada pelas lições de “sim” e “não” das namoradas).

Mas ainda procurava uma forma de se fazer entender. Buscava, então, um equilíbrio entre a simplificação e a sofisticação das assertivas. E notava, finalmente, que não seria pelo significado intrínseco das palavras, mas sim pelo seu valor no que dizem respeito ao próprio sujeito.

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

(In)certezas

Das muitas certezas que eu não tenho, uma é sobre o que de fato me toca quando me refiro a momentos especiais, se são datas específicas ou simples situações quotidianas.

Não quero me referir a grifos na agenda em razão de coisas boas ou ruins que tenham acontecido porque essas, sem aviso nem licença, acabam tomando espaço próprio. São aprendizados, alegrias, saudades ... que se tornam simultaneamente atemporais e presentes. É como se um risco no calendário se transformasse numa cicatriz na própria pele. Não dói mais, mas ainda é capaz de lembrar do motivo a que veio.

Quero falar daquelas situações onde as palavras e as gargalhadas - ou mesmo as lágrimas - brotam com espontaneidade e força capazes de lembrar ao mais cético dos homens - espécie, não necessariamente gênero - que a vida acontece e se faz a cada minuto. Que um encontro com antigos amigos/colegas pode ser - e de fato é - oportunidade de relembrar e, ao mesmo tempo, de construir novas histórias. Que apesar das divergências na forma como percebem a realidade, as pessoas devem ser admiradas e respeitadas pelas semelhanças que são capazes de manifestar entre si. Que se as diferenças oferecem muros, o exercício da identidade pode criar pontes. Que falar de amor com os olhos brilhando não é coisa de poetas ou desvairados ... é simplesmente uma forma desapegada de festejar a vida e de não se levar tão a sério ...

Em outras ocasiões mencionei a nostalgia pelas coisas não vividas ... pois percebo que até ela, que tem sido minha fiel companheira de jornada, já não se refere a dias certos. Um de nós, talvez mais amadurecido, tomou um ar menos formal e percebe o excepcional que há em ocasiões banais, como um feriado qualquer na província, conversando e celebrando o ritual do chimarrão entre amigos ...

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Pra refletir ...

Encontrei o link no blog do Inagaki que, por sua vez, mencionou a recomendação da Julia Fontelles. Trata-se de peça publicitária sobre a violência doméstica contra crianças, encomendada pelo governo do Líbano à agência Saatchi & Saatchi. No final, a mensagem "algumas crianças gostariam que seus pais fossem animais".

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Futuro do Pretérito

Considerando que hoje é segunda-feira, eu poderia falar do fim-de-semana tedioso da província e da absoluta falta de alternativas interessantes de lazer. Mas isso acabaria por se tornar desagradável, como toda insistência em lugares-comuns.

Tentando dar ao assunto um ar mais engajado, poder-se-ia comentar sobre a paralisação de agências bancárias na sexta-feira passada, cuja votação em assembléia acabaria por considerar válidos votos de "colegas" de uma instituição privada que detinha "interdito proibitório" - ou seja - teria judicialmente garantido o dia inteiro para explorar seus negócios, enquanto as demais "protestariam por aumento salarial e melhores condições". Mas isso consituiria tema por demais polêmico e, via oblíqua, desagradável.

Ainda no âmbito do engajamento, poderia tentar digerir a (má) impressão com relação ao aparato montado e dispendido, também na sexta-feira passada, com a visita da digníssima mandatária do nosso estado à província; o que levaria a considerações acerca de protocolos, recursos estaduais declarados escassos e capacidade administrativa por vezes questionada e criticada. Mais uma vez, tropeçaríamos na "tensão dos temas", por assim dizer.

Claro que haveria momentos interessantes e muito menos tensos a comentar, como a reunião no Quiosque pra comemorar o aniversário de um colega de trabalho. Cervejas geladas e conversa leve. Também poderia falar do reencontro com um colega-amigo com quem não falava há uns quinze anos, pelo menos. Poderia divagar sobre a confirmação das expectativas de vida que tínhamos quando adolescentes, principalmente sobre trabalho e família. Ou sobre o respeito necessário às diferentes percepções da realidade, que são capazes de fazer qualquer gestor de recursos humanos arrancar os cabelos quando busca metas e resultados. Mas enveredaria por abordagens filosóficas ou psicológicas que soariam um tanto pedantes.

Deixando todas essas temáticas de lado, poderia simplesmente comentar sobre o filme "Tropa de Elite", que acabei baixando da internet e assistindo no domingo. Mas não conseguiria evitar comentários que estragariam a experiência dos que, diferentes de mim, aguardam por assistir nos cinemas.

Então, abandonando o tempo verbal que deu título a este post (e consciente de que poderia ter escolhido um melhor), decido: comento sobre uma das minhas mais recentes descobertas na blogosfera ... a "funk band" japonesa chamada Osaka Monaurail. "Surpreendente" é pouco pra defini-los. Encontrei a dica aqui.

Assista ao vídeo. Vale a pena.