domingo, 24 de junho de 2007

Desvio de tempo

Outra madrugada, mais um final de semana. Mesmo depois da pequena elevação do teor etílico no sangue, a noite provinciana se apresentava sem graça e as alternativas existentes estavam fora de cogitação.

Pouco humor. Pouca paciência. Pouca vontade, pra dizer a verdade.

Aliás, no que diz respeito à vontade, cria que era necessário haver paixão pra se fazer qualquer coisa. Vontade mesmo, não simples inclinação ou falta de opção. Adotava – e sempre citava – os versos do Gessinger: “nem sempre faço o que é melhor pra mim, mas nunca faço o que eu não tô a fim” ... Conhecia – na prática – o preço a pagar por isso, mas era franco ao admitir não ter talento pra empurrar situações com a barriga ou pra tratar a vida e as pessoas de forma burocrática.

Destination: Home, swett home.

Sem nada melhor pra fazer, tinha na internet um universo alternativo e, enquanto escutava música e saturava seus “ratônios” com informações e imagens desconexas, a TV não merecia atenção ... a luz colorida projetada apenas servia como holofote às confusões e incertezas que lhe ocupavam a mente.

Tentava seguir o conselho de uma amiga – segundo ela mesma, mais virtual do que real, já que quase não se viam – e trabalhar o “desvio do tempo”, que consistia em uma estratégia consciente de não pensar no que incomodava. Algo como “encher a cabeça pra não sentir vazio o coração” ...

De repente, os versos de Vinícius: “Tristeza não tem fim ... felicidade, sim” ... e se via quase beirando o infame “coitadismo”, que tanto combatia e condenava ...

Mudando o ponto de vista, notava que, afinal, era bom que houvesse certa verdade naqueles versos. A tentativa de mitigar as próprias tristezas vinha sendo, no mais das vezes, o seu grande combustível pra vida. Planos, ambições, expectativas ... tudo convergia ao tosco gesto de preencher e dar sentido àqueles ocos momentos, sempre presentes e nunca desejados. Fosse tudo somente alegria, a vida seria tão tediosa ...

Entendia sua jornada quixotesca como se fosse a alegoria da pedra filosofal alquímica, assim como trabalhar incessantemente a própria inquietude – como se fosse chumbo – até que pela repetição, pela observação dos processos, pela depuração do agente, surgisse a sabedoria necessária para aquietar o espírito – daí, então, o almejado ouro.

Sorria, afinal. Divagação oblíqua, conclusão reconfortante. Por enquanto.

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